Engraçado, ontem na Praça do Ferreira me deu uma vontade imensa de pergunta a um daqueles homens quanto eles cobram para engraxar sapatos... Eu com meu tênis esportivo. Tudo que eu quis foi pagar pra ele o valor cobrado e pedir-lhe sua companhia num tempo cronometrado de quando ele engraxa... Não tive coragem. Fiquei com medo. Sei lá, ele ia achar que eu estou muito sozinha. ...?
Ps. Pelas fotos eu queria ter ouvido o que nas imagens estão implicitas...
"A palavra alpendre nos é preciosa. Remete a marcas que nos foram deixadas por longas noites de histórias, relatos e conversas acumuladas no aconchego de um alpendre. Nos faz lembrar esse território plástico que na sua lisura pode ser transformado, convertido e reconvertido, palco de brincadeiras e invenções, lugar do espírito de alegria e criação. Lugar de pouso e pausa para os que passam, lugar de acolhida e flerte com alteridade. Mas um alpendre também é esse lugar entre a casa e a rua, o exterior e o interior, espaço das trocas e dos fluxos. É aí que nos reencontramos, no meio dessas ressonâncias, no lugar das conversa, invenções, dos pousos e pausas, das trocas. É aí que o Alpendre vai se configurando como um lugar de passagens, um entrelugar. Um espaço constituído por esses fluxos, interface entre o dentro e o fora. Uma espécie de acumulação por vizinhanças que não deve ser reduzida a uma simples aproximação, mas que potencialize os encontros, busque consistências, multiplicidade e leveza. Um jogo que a cada lance amplie o lugar da criação e do pensamento. Queremos construir esse espaço como se constrói um conceito. Interessam as questões contemporâneas com as quais a criação e o pensamento se embatem. Experimentar caminhos, como viajantes que não precisam habitar uma cidade, um estado, um país, mesmo que eles nos habitem. Nômades, mesmo que em nossos territórios, habitantes de uma velocidade intensiva." (Alexandre Veras)
"Entrar em uma sapataria talvez seja uma das experiências mais contundentes da imperfeição do mundo. Os sapatos em desordem, o cenário precário e sublime resistindo a velocidade do capital e das mercadorias, o pó e o cheiro de graxa nos lembrando uma outra química de tempo. Os pequenos espaços das sapatarias ainda resistem ao layout clean da arquitetura das vitrines coloridas onde tudo parece estar no lugar. Ali, nos lembramos que o corpo tem feridas e cicatrizes, que a vida está cheia de curativos, que os sonhos envelhecem e que inevitavelmente os objetos estragam. Um dia fui levar uma bolsa no sapateiro que costumo ir perto de minha casa e comentei que traria mais tarde duas pequenas malas estragadas. Digo ao sapateiro: “Os objetos vivem estragando!” Ele, atento à complexidade de meu enunciado, sem pretensão, me responde: “Ainda bem! Se não estragassem eu não viveria!”. Senti-me subitamente reconfortado, e a vida, em um passe de mágica, parecia adquirir o equilíbrio sereno da precisão de suas palavras. Ele vive da imperfeição do mundo e seu comentário tomou uma densidade filosófica: lembrei-me imediatamente de uma frase de Franz Kafka: “Só há um ponto fixo. É a nossa própria insuficiência. É daí que é preciso partir.” Sua sutil inversão dos dois verbos (viver /estragar) reorientou meu olhar. São estes tropeços que ainda restauram nossa humanidade e nos provocam o pensamento como pequenas pausas diante da fúria do bom funcionamento. Pensar é confrontar-se com o em falta da perfeição. Como lembra Jean Frémon “a perfeição é uma superfície muda que abandonou a vida, a perfeição é de um outro mundo na porta do qual está escrito: não se entra!”.1 Felizmente podemos entrar nas sapatarias. Estes lugares nos despertam da paralisia de um ideal que se esqueceu de nós. É preciso buscar um pensamento que surja do precário, da insuficiência das categorias conceituais e que ainda se interesse pela dor dos outros." (Edson Luiz André de Sousa)
Uma invenção da utopia...
ResponderExcluirEngraçado, ontem na Praça do Ferreira me deu uma vontade imensa de pergunta a um daqueles homens quanto eles cobram para engraxar sapatos... Eu com meu tênis esportivo. Tudo que eu quis foi pagar pra ele o valor cobrado e pedir-lhe sua companhia num tempo cronometrado de quando ele engraxa... Não tive coragem. Fiquei com medo. Sei lá, ele ia achar que eu estou muito sozinha.
...?
Ps. Pelas fotos eu queria ter ouvido o que nas imagens estão implicitas...